23 de set. de 2009

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No princípio, era o adjunto adverbial.
Seria mais simples se tratasse da obviedade metalinguística ao invés de relatar sobre o universo em expansão dentro de mim. Big Bang! Talvez escrever sobre a primeira lembrança que tenho da minha vida faça mais sentido a este pontapé textual do que quaisquer pretensões de parecer interessante.
Pois bem, a memória mais antiga que possuo é feita de chuva e lama: eu brincava no imenso quintal construindo represas delicadas com pedras e gravetos, desviando os filetes de água que desciam de uma encosta vizinha e abrindo pequenas crateras onde desaguavam esses pequeninos córregos. Criava a hidrografia de um território só meu e, por consequência, a geografia de todo meu universo particular. Montanhas, rios, planaltos, cachoeiras, depressões, lagos e demais acidentes preenchiam o vazio de um Deus em forma de criança que raramente tinha alguma humanidade disponível para divertir-se.
Por mais que eu seja ateu, entendo o que motivou Deus (qualquer um deles) a criar o ser humano: a Solidão.
Palavra pesada, solidão é o sentimento com que mais convivo desde a primeira vez que me dei conta que eu era soberano numa terra inóspita. Ainda que a chuva tornasse o chão mais macio e úmido, eu e meu continente éramos apenas aridez (aridez e solidão).
Não estou certo, mas acredito que muitas vezes chorava (as lágrimas misturando-se às gotas de chuva formam uma imagem poeticamente bela, mesmo que jamais existente) pelo vazio em meio às voltas que eu dava em torno dos meus domínios, como o traço que retorna ao princípio para fechar-se em zero, encerrando o vazio dentro de si para que não se espalhe e contamine o que há de valoroso ao seu redor.
Porém, não é possível tornar-se um sem antes abandonar o zero. Em resumo: o tempo permitiu que esse ponto singular e minúsculo transbordasse e explodisse para todas as direções. Assim, eu e o universo compartilhamos de uma mesma teoria para o princípio de nossa existência... destinados ao infinito e além.
Big Bang!

4 comentários:

Well Bernard disse...

Como você é insuportável, até para escrever você presta.

O Gato de Cheshire disse...

Achei o comentario do Well absolutamente pertinente... presta e muito, insuportavel mesmo...

A sequencia da formação subjetiva que "começou" com um filete de água acaba de desaguar no grande oceano da blogsfera. Agradecemos pela generosidade em dividir tudo isso conosco que procuraremos degustar com o requinte que o autor merece...

Bem vindo!!!

Caco disse...

Texto lindo. Lembrei de quando eu brincava com a terra e com a água. Ô, mas era bom. Eu também não sei se a primeira lembrança que eu tenho é totalmente real. Eu nem sei se é, de fato, a primeira.

Cristiano Contreiras disse...

Bom texto e conceito de blog!

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Reino enquanto houver um Reino.

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Todas as pessoas mencionadas em meus textos tiveram seus nomes trocados para preservar a identidade alheia e minha integridade jurídica...
Afinal de contas, não quero ser processado!